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quarta-feira, 4 de maio de 2016

Secagem da Madeira

Introdução Em edição anterior desse nosso informativo digital Pinusletter (http://www.celso-foelkel.com.br/pinus_15.html#quatorze) foram destacados os principais defeitos de origem natural e de conservação da madeira dos Pinus. Faltaram ser comentados os defeitos e não-conformidades gerados através do seu beneficiamento. Assim, o objetivo desse texto técnico foi o de trazer aos leitores informações sobre como identificar e evitar tais problemas. Apesar de ser um recurso renovável, a crescente demanda mundial por madeira, assim como o aumento das preocupações ambientais, têm feito com que a sua utilização seja cada vez mais racional e sustentável. Com isso, todo esforço para reduzir ao máximo os desperdícios e aumentar a sua durabilidade. De acordo com Limeira (2003), os defeitos decorrentes do beneficiamento da madeira também são divididos em: defeitos de produção/desdobro e defeitos de secagem. Todas as mudanças e irregularidades negativas das características físico-químicas e mecânicas da madeira serrada são considerados defeitos, que no geral prejudicam a qualidade, assim como o desempenho da peça, limitando o seu uso (Martin et al. 2002). Logo, apesar das vantagens que a madeira possui, tais como a variabilidade de dimensões das peças, permitir ligações e emendas, boa resiliência e resistência mecânica, há também desvantagens no seu emprego, e uma das principais, com certeza, é a presença dos seus diversos tipos de defeitos. Eles causam a diminuição do volume da madeira aproveitada, perdas de rentabilidade, durabilidade e prejudicam a sua estética (Martin et al. 2002). Da mesma forma que os defeitos causados pela má conservação da madeira, os devidos ao beneficiamento podem também ser evitados, ou ao menos amenizados, garantindo melhores valores do produto na hora da classificação das peças. Como já visto, os defeitos relacionados ao beneficiamento encontram-se em dois grandes grupos: os devido ao secamento ou secagem e os gerados durante a produção ou desdobro. Alguns dos principais defeitos de produção são as fraturas, as fendas, cantos quebrados e fibras reversas. Já para a secagem citam-se as rachaduras, o fendilhamento, o abaulamento, o arqueamento e a curva lateral (Zenid et al. 2009). Há dois tipos de classificação dos defeitos: visual (por aparência) e por uso final proposto (Carreira et al. 2003; Carreira e Dias, 2006). Pela classificação visual das peças é que se classifica grande parte das madeiras provenientes de Pinus e de outras coníferas. Temos no Brasil o “Manual Prático de Normas Reguladoras de Qualidade das Madeiras de Pinho no Mercado Nacional", da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas). Dentre essas normas destacam-se a NBR 17700 e a NBR 11869, entre outras, que normalizam sobre a “Madeira Serrada de Coníferas Provenientes de Reflorestamento para Uso Geral” (Zenid et al., 2009; Zenid, s/d; Ferreira et al. 2003; Garcia e Ramos, 2008). Os últimos autores apontam, que apesar das normas existirem, ainda são pouco empregadas no mercado interno, havendo uma despadronização de dimensões de peças que prejudicam os diversos setores que necessitam da matéria-prima, principalmente o da construção civil. Logo, o uso das classificações, bem como das normas deveriam ser seguidos de forma mais rigorosa, possibilitando assim o melhor uso da madeira racional de acordo com os defeitos que possuem (Carreira e Dias, 2003). Seguem a seguir a descrição dos principais defeitos da madeira devidos ao beneficiamento: 1. Defeitos de secamento ou secagem A madeira, por ser um material orgânico, fibroso e poroso, logo após sua derrubada possui elevada quantidade de água que varia de acordo com a espécie, época de abate, idade da árvore, entre outros. Essa madeira recém cortada é denominada de madeira verde e em alguns casos a quantidade de umidade no seu interior pode chegar a exceder o seu peso seco (Limeira, 2003). O teor de umidade da madeira é muito relacionado à sua densidade: madeiras pouco densas, como as dos Pinus, têm mais espaços em sua estrutura para colocar água, logo são muito úmidas no abate. Após o corte da árvore em toras, as paredes celulares passam a liberar a água livre contida no interior celular em grandes proporções, ocorrendo assim a secagem natural propriamente dita. A perda da umidade acontece até que essa se encontre em equilíbrio higroscópico com a umidade ambiental (Rodriguez, 2009). Durante a perda da água livre, a madeira não sofre contrações volumétricas. Isso passa a acontecer no momento em que começa a perder a água de adesão, que é aquela existente dentro das paredes celulares. A água de adesão, também chamada de água impregnada, somente pode ser extraída da madeira após a retirada da água livre do interior do lúmen celular. Isso ocorre normalmente quando se atinge cerca de 20 % do teor de umidade em relação ao peso seco da madeira. Esse estágio é chamado de "ponto de saturação de fibras" (PSF). Toda a perda de umidade abaixo desse ponto aumenta a sua resistência, gerando entretanto a perda de dimensões por contração da madeira (Szücs et al. 2006). O secamento (secagem) da madeira é um processo extremamente importante para a sua maior durabilidade e conservação (Molina, 2009), ocorrendo também a transformação de alguns compostos antes orgânicos em inorgânicos por cristalização de íons (Limeira, 2003). Além disso, a perda de água em abundância faz com que apenas a água das paredes celulares permaneça na madeira. Sua retirada pode provocar tensões e contrações, que podem causar defeitos também devido à movimentação dos tecidos. Jankowsky e Silva (1985) relataram que durante a secagem da madeira forma-se um gradiente de umidade entre o interior da peça úmida e a superfície evaporante. Tal gradiente possui fluxo contínuo de movimento de água que vai depender das condições ambientais e da permeabilidade da madeira. Dessa maneira, o processo da secagem deve ser realizado de forma a evitar tensões internas demasiadas, assegurando-se o equilíbrio higroscópio apropriado entre a madeira e o ambiente e não permitindo-se problemas como dilatações e contrações (Rodriguez, 2009). Segundo o mesmo autor, há três tipos de secamento mais utilizados em madeiras: o secamento ao ar livre, o secamento artificial e o misto. Na secagem em condições ambientais naturais (ao ar livre), as tábuas dispostas para secar são acondicionadas em locais bem arejados e sombreados. As pilhas são confeccionadas distanciadas do solo e mostrando espaços variados de separação entre cada peça, em função das dimensões das peças. Assim, o ar que vai passando entre os espaços livres faz seu papel para a retirada de umidade de forma progressiva, podendo chegar a percentagens de umidade de 11 a 15 % na madeira. (Bueno, 2000; Limeira; 2003; Rodriguez, 2009; Molina, 2009). Já durante o processo artificial, as tábuas são acondicionadas em estufas contendo temperatura e umidades controladas. Nelas, há a circulação de ar quente, geralmente a 75°C, misturado com vapor, que conduz a uma umidade na madeira de 5 a 10 %, em cerca de seis dias, dependendo da finalidade de seu uso. Devido à rapidez do processo, um dos principais inconvenientes e que merece máxima atenção é o surgimento de rachaduras provocadas por tensões internas. A secagem mista nada mais é do que a utilização conjugada dos dois métodos anteriores. Primeiramente a madeira é secada naturalmente e posteriormente emprega-se a secagem artificial para conseguir alcançar percentagens de umidade inferiores às alcançadas pela forma ao ar livre. A madeira possui higroscopicidade, adequando o seu teor de umidade às condições ambientais em que se encontra. Logo, mesmo após secagem correta, continua sofrendo essas influências do ambiente externo, podendo ocorrer alterações em suas dimensões e mesmo assim, provocar deformações (Limeira, 2003; Szücs et al. 2006). Em estudo visando observar a qualidade da madeira de Pinus serrada na Quarta Colônia de Imigração Italiana no Rio Grande do Sul, Gatto e colaboradores (2004) constataram que a secagem ao natural foi a principal forma utilizada. Porém, a quantidade de defeitos observados sugere mudanças e adequação de tecnologias. Isso porque 75% da madeira verde (recém-abatida) foi classificada como de primeira qualidade e após secagem natural, essa percentagem caiu para 45 %. De acordo com Jankowsky (2002) e Limeira (2003), são as tensões de perda de umidade os grandes causadores dos defeitos provenientes nos diversos tipos de secagem da madeira. Essas não-conformidades são provocadas tanto durante processos de secamentos ineficientes como também durante a armazenagem em condições ambientais indesejadas (Costa, 2008). Os defeitos podem se manifestar diferentemente e os principais são: - Rachaduras e fendas: são formadas devido às diferenças de umidade, gerando retrações nas direções radial e tangencial e que causam o aparecimento desses defeitos, geralmente após a secagem rápida da madeira nas primeiras horas (Quioirin, 2004; Szücs et al. 2006). A tensão provocada pelo diferencial de umidade gera ruptura do tecido lenhoso, podendo ser observadas visualmente como aberturas, principalmente nas extremidades das peças. Durante a secagem de toras, o tecido superficial seca mais rapidamente do que o interior, gerando uma tensão superior à resistência dos tecidos, provocando assim a sua ruptura nos locais onde há maiores quantidades de células parenquimatosas. Além das rachaduras superficiais, também há as rachaduras em favos, observadas no interior das peças provocadas por secagem artificial. Diferenças de tensões ocasionam o colapso da resistência das fibras no sentido perpendicular causando a deformação. Essas rachaduras também são chamadas de encruamentos, que ocorrem geralmente devido à secagem muito rápida e também desuniforme da madeira. O exterior da peça seca antes que o interior e quando esse último começa a secar se retrai de forma que a parte superior não consegue acompanhá-lo, ficando em compressão, formando-se as rachaduras. As fendas ou fendilhamentos também são provocadas pelas mesmas razões anteriores e são observadas como pequenas aberturas ao longo da peça (Costa, 2008; Rodriguez, 2009). - Empenamento: consistem em qualquer torção ou distorção dos planos originais da superfície da peça, ou seja, nas três direções da tora (longitudinal, radial e tangencial). A madeira é um material ortotrópico, possuindo diferença comportamental de acordo com a orientação de suas fibras. É de acordo com essa forma que suas propriedades vão variar conforme esses eixos de origem (longitudinal, radial e tangencial) que são perpendiculares entre si. Há vários tipos de empenos, sendo os mais comuns os longitudinais, encanoados e os torcidos. Segundo Limeira (2003) o empenamento também pode ser chamado de curvamento, curvatura lateral, arqueamento e abaulamento, dependendo do sentido em que houve a distorção (Szücs et al. 2006). O empenamento encanoado pode ocorrer quando uma das faces da peça seca mais rapidamente do que a outra, ou seja, há uma secagem irregular. Isso é comum quando uma das faces fica totalmente apoiada demorando mais para perder a umidade na superfície em relação à outra face, que está totalmente livre e em contato com o ar (Costa, 2008). Peças em forma de canoa ou aspecto acanaletado também podem surgir por diferença de estabilidade das dimensões radiais e tangenciais. O empenamento longitudinal também pode ser chamado de curvatura e ocorre quando há um afastamento de uma das faces ao plano original. Esse defeito é comum quando há irregularidades na grã (direção das fibras). O torcimento também ocorre por diferenciação na grã da madeira, que nesse caso, é espiralada (Jankowsky, 2002). - Colapso: ocasionado devido às elevadas tensões de saída da água das células, levando à deformação. No colapso observam-se ondulações na superfície da madeira devido à quebra da resistência dessa pelas tensões provocadas durante seu secamento. Há alguns fatores que influem no colapso da madeira. Esses são: altas temperaturas no início da secagem, pequenos capilares da madeira e alta tensão superficial do material aquoso da madeira. 2. Defeitos de produção Os defeitos da produção ocorrem logo após o abate da árvore, em seu desdobro e secagem. O desdobro da madeira ocorre geralmente nas serrarias, onde as toras das árvores são serradas, geralmente com serra-fita, em peças contendo dimensões definidas, sendo assim transformadas em tábuas, também chamadas de pranchões, contendo espessuras entre 7 a 20 cm (Limeira, 2003; Mendonça et al. apud Szücs et al. 2006). Os mesmos autores afirmam que cuidados com os equipamentos de desdobro devem ser tomados a fim de não provocar irregularidades dimensionais. Esses defeitos são bastante comuns prejudicando a qualidade da madeira para os seus diversos fins. A escolha inadequada do processo de desdobro também pode gerar defeitos, podendo inclusive haver seu agravamento após a secagem. Um defeito visual comum em madeiras é a presença de queimaduras provocadas por máquinas. Quando os dentes das serras travam podem provocar um superaquecimento no local da peça que gera mudança da coloração da madeira, semelhante a uma queimadura (Common Defects...2009). Segundo Neri et al. (2005) as serrarias possuem tecnologia e processo de desdobro variado, o que pode influenciar diretamente na qualidade da peça e no rendimento da madeira. Logo, uma pesquisa foi desenvolvida objetivando avaliar o rendimento de madeira de Pinus taeda submetida a três diferentes técnicas de desdobro primário, observando também os principais parâmetros que afetaram significativamente o processo. Para as três técnicas empregadas, esses parâmetros foram: equipamento de corte utilizado, forma de desdobro, tipo de produto serrado e espessura da serra, alguns desses também afetando o rendimento da madeira. O tipo de desdobro em forma de bloco para o fatiamento foi a técnica que apresentou melhores rendimentos de madeira (52 %). Segundo Limeira (2003), os principais defeitos causados pela produção e desdobro são: - Fraturas: quebras ou ausência de partes da peça, principalmente dos cantos, causadas por danos mecânicos, prejudicando sua aparência e conseqüentemente seu dimensionamento. As fraturas são defeitos ocasionados durante a serragem (Bueno, 2000). - Fendas: Separação longitudinal das fibras pela perda de resistência causada por danos mecânicos. - Danos do abate: Parte da peça danificada fisicamente, com machucaduras devido a danos durante a queda e corte da árvore (Bueno, 2000). Como evitar defeitos de produção e secagem De acordo com Limeira (2003), a época do corte da árvore pode ajudar a prevenir alguns dos principais defeitos de produção da madeira. Recomenda-se o abate durante os períodos mais frios do ano, onde a maioria das espécies encontram-se em repouso vegetativo, reduzindo-se a translocação de seiva e outras substâncias que são substratos para a proliferação de fungos, insetos e outros agentes depreciantes da madeira. Temperaturas mais amenas fazem com que a madeira cortada na época perca mais lentamente a umidade, diminuindo o aparecimento das fendas de retração. Escolher as ferramentas e equipamentos adequados para o corte, desdobro e serra da madeira, efetuando estudos prévios de todos os fatores envolvidos no processo, também são medidas de prevenção de muitos defeitos. Alguns dos parâmetros que aumentam o rendimento da madeira, e conseqüentemente a sua qualidade, são: seleção das toras por classe diamétricas, tratamento otimizado de toras, otimização do sistema de desdobro através de softwares, visores óticos para detecção de defeitos durante o desdobro, feixes de laser e layout adequados aos sistemas de beneficiamentos, etc. (Néri et al. 2005). O conhecimento das características físico-químicas e mecânicas das espécies arbóreas também contribui para a diminuição dos defeitos gerados durante o beneficiamento (Szücs et al. 2006;Rodriguez, 2009). Uma das principais maneiras de evitar danos de produção e de secagem é o bom manejo florestal, o qual propicia homogeneidade nos povoamentos, tendo como conseqüência a diminuição de irregularidades (Szücs et al. 2006). Além do estudo do maquinário e tecnologia ideal para prevenir defeitos de produção, treinamento de mão-de-obra durante esses processos, assim como revisão periódica das condições das ferramentas também são outras medidas preventivas aos defeitos (Néri et al. 2005; Szücs et al. 2006). Com relação à secagem, o conhecimento das propriedades químico-físicas e mecânicas das espécies de madeira, assim como os principais fatores ambientais que influem no equilíbrio higroscópico da madeira poderiam evitar problemas de retração e posteriores surgimentos de defeitos. Revisões periódicas de estufas, monitoramento durante o processo de secagem e a realização de testes de prova de secagem, anteriores ao processo com grandes quantidades de peças, poderiam evitar danos e irregularidades. Muito importante seria que para cada tipo de madeira houvesse curvas de secagem pré-definidas e otimizadas. O armazenamento ideal após a secagem, bem como o tratamento com produtos impermeabilizantes após o secamento, também são medidas que evitam e retardam a reumidificação da madeira, ajudando assim na sua conservação (Costa, 2008; Rodriguez, 2009). Considerações finais A madeira, apesar de ser um bem renovável para a sociedade, torna-se cada vez mais escassa e difícil de ser reposta. Portanto, a busca pela melhor utilização e durabilidade das suas peças, assim como o uso racional estão crescendo em ritmos acelerados. As madeiras provenientes de reflorestamentos como as de Pinus e de eucalipto também ganham espaço no setor florestal devido à preferência no mercado externo, principalmente por possuírem em grande parte bons manejos florestais e selos verdes. Logo, as normas de classificação dos defeitos da madeira são bastante demandadas para a exportação desses produtos; no entanto, isso ainda não ocorre para o mercado interno no Brasil (Garcia e Ramos, 2008). O mercado consumidor brasileiro também deveria ser melhor informado a respeito da classificação das madeiras, exigindo produtos que satisfaçam as suas necessidades, ou melhor, madeira com características ideais para cada finalidade (Carreira e Dias, 2003). De acordo com Szücs e colaboradores (2006) o mau emprego das peças é um dos principais fatores para a depreciação da madeira. Logo, a identificação das características das espécies, bem como a de seus principais defeitos, deveria ser do conhecimento dos profissionais que trabalham no setor buscando a prevenção desses problemas e conseqüentemente levando ao aumento dos lucros com a madeira de melhor qualidade. Pesquisas sobre novas tecnologias de beneficiamento da madeira e de manejo florestal, que promovam a qualidade da madeira serrada e o bom rendimento de toras, precisariam ser incentivadas assim como seus resultados estendidos aos produtores e madeireiras promovendo assim a consciência da preservação ambiental e do uso sustentável da madeira (Néri et al. 2005). Muita coisa tem acontecido nos anos mais recentes no Brasil em termos de redução de desperdícios nas indústrias que utilizam a madeira como matéria-prima. Entretanto, muitas vezes essas otimizações apenas se baseiam na queima dos resíduos para gerar energia, o que pode reduzir resíduos, mas não resolve o problema do mau uso das toras para a produção de peças de madeira serrada ou de móveis, painéis, etc. Portanto, estamos melhorando nossos processos, mas ainda há muito espaço para novas e desejadas otimizações.

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